Apesar de ser lembrado pela praia e pelo sol, o Ceará também abriga um paraíso natural que já foi lar de ursos no passado e hoje tem uma gruta grandiosa como destino turístico. Estamos falando do Parque Nacional de Ubajara, na Serra da Ibiapaba, onde fica localizada a Gruta de Ubajara, atrativo famoso de cerca de 1,2 quilômetros acessado por um passeio de bondinho elétrico.
Para viajar ao local, localizado a cerca de 320 quilômetros de Fortaleza, são cerca de cinco horas de estrada desde a capital. No entanto, a partir de julho deste ano, quem quiser visitar a Gruta de Ubajara sem sair de casa vai poder acessar o projeto DocumentaCE, que guardará uma digitalização do espaço natural. A plataforma foi desenvolvida pelo Instituto de Arquitetura e Urbanismo e Design (IAUD) da Universidade Federal do Ceará (UFC).
Utilizando tecnologias de realidade virtual, o professor Esequiel Mesquita e sua equipe conduzem uma experiência inédita com o objetivo de tornar o passeio mais acessível e contribuir para a preservação, a pesquisa, o turismo e a educação sobre a Gruta de Ubajara:
"Nós começamos, em uma atividade bem pioneira ainda aqui no Brasil, a desenvolver esse tipo de atividade de digitalização no patrimônio histórico. E uma vez que nós adquirimos essa experiência, fizemos uma visita até Ubajara. Quando visitamos o Parque, me veio essa ideia de digitalizar a gruta. Nós vimos que as pessoas que iam visitar - uma parte delas idosos ou pessoas com mobilidade reduzida - iam ao local mas acabavam por não conseguir fazer o trajeto dentro da gruta (...) que tem espaços apertados, escuros. Nós tivemos a ideia por esse motivo, para dar mais acesso à população", explicou Esequiel ao g1.
Para tornar a digitalização possível, a equipe contou com equipamentos de ponta, como scanner a laser de alta resolução, drones e câmeras térmicas. Resumidamente, a digitalização funciona assim:
O scanner lança cerca de 400.000 pontos por captura
A partir desses pontos, é gerada uma nuvem tridimensional que permite reconstituir a volumetria de um espaço e os aspectos de suas superfícies
Ao juntar esses dados da nuvem com os dados de fotografias em 360º é possível recriar o espaço em uma versão virtual.
A ideia é desenvolver um passeio virtual tanto para telas planas quanto para imersão em 3D (com o uso de óculos específicos).
O projeto está na fase de processamento de dados e, logo mais, estará disponível para todos os usuários. Essa não é a primeira digitalização da equipe. Acessando o site é possível visitar virtualmente o Theatro José de Alencar, Museu da Imagem e do Som, Cineteatro São Luiz, entre outros espaços.
"E uma novidade que nós acabamos de descobrir processando os dados é que o formato da gruta é diferente do que se conhecia até então (...) Esse tipo de trabalho me permite um escaneamento tridimensional, então consigo capturar as formas, as texturas. Fica um levantamento mais preciso de como é essa caverna. Já nessa etapa, percebemos que o formato da gruta é diferente do que dos modelos que existiam até então. Isso vai dar outra contribuição para o entendimento dos processos de formação e educação", comentou o professor.
Apesar de já terem feito trabalhos semelhantes anteriormente, a equipe nunca havia trabalhado com um espaço natural com tantas curvas, texturas, temperaturas e umidade. A falta de luz em alguns pontos tornou a digitalização ainda mais desafiante:
"Nós usamos um equipamento que tem um laser de altíssima precisão. Esse laser faz o escaneamento da área em 360 graus. À medida que esse laser vai batendo nos obstáculos, nas paredes, ele vai gravando essa informação (...) Juntamente com o laser, tem uma câmera que tira também fotos em alta qualidade para ajudar a montar o modelo tridimensional do passeio. Esse trabalho não poderia ser feito há dez anos, porque nós não tínhamos equipamentos para isso.", disse Esequiel.
O objetivo da digitalização, de acordo com os pesquisadores, não é substituir a visitação presencial, mas popularizar o patrimônio natural.
Renan Paulo, estudante de mestrado em engenharia civil na UFC de Russas, participou da digitalização e compartilha a experiência de iniciar um projeto inédito:
"O objetivo disso tudo é fazer com que as pessoas sintam uma espécie de gostinho de o que é que seria essa gruta, além de documentar. As pessoas vão lá, elas veem, observam, ficam curiosas. É o que acontece nos países na Europa, onde os museus são visitados de forma virtual", disse Renan ao g1.
Foram cinco dias para fazer todas as capturas. O estudante disse ter vivido uma "experiência ímpar":
"A possibilidade de conseguirmos digitalizar e preservar e documentar um patrimônio natural é excepcional para mim. Outras iniciativas em outros países fazem esse tipo de documentação em patrimônios edificados, como nós estávamos fazendo em Fortaleza. Mas a ideia de preservar um patrimônio natural é um pouco única. Saber que tem nosso trabalho nisso, que nós estamos colaborando para a criação de um modelo preciso dentro da gruta, pode ser um pontapé inicial para trabalhos futuros. Creio que esse trabalho seja bem positivo para a nossa sociedade cearense", reforçou o mestrando.
Como realizar o tour virtual
Para "passear" pela plataforma, é simples: basta abrir a plataforma (em computadores, notebooks, smartphones ou tablets) e utilizar um mouse ou cliques na própria tela para se movimentar. Você poderá parar quando quiser para observar algum detalhe específico.
Já no passeio feito para imersão em 3D, com o uso de óculos de realidade virtual, o visitante terá a impressão de estar imerso dentro da gruta - como em um filme no cinema.
"Quando eu faço um levantamento desse, eu abro para que outras pessoas com mobilidade reduzida ou com dificuldade de acesso geográfico possam conhecer. E do ponto de vista da pesquisa, isso abre uma nova gama de pesquisas (...) No fundo, você tem contribuições científicas, de inovação, além do potencial para a educação do ensino básico e fundamental. Como o passeio fica disponível na plataforma, os professores conseguem acessar na sala de aula, entrar e fazer a visita virtual", concluiu Esequiel.
Mapa da Gruta de Ubajara em nuvem de pontos. Imagem impressiona. — Foto: Divulgação
Mapa da Gruta de Ubajara em nuvem de pontos. Imagem impressiona. — Foto: Divulgação
Saiba mais sobre o projeto DocumentaCE
Esequiel Mesquita, coordenador do projeto, fala sobre digitalização de Gruta de Ubajara
A digitalização da gruta de Ubajara é o 12º espaço a ganhar um tour virtual dentro de um projeto de tecnologia e inovação voltado ao patrimônio cultural do Ceará, uma das frentes que integra o programa Cientista Chefe da Cultura. Iniciado em 2021, o projeto vem digitalizando prédios históricos e equipamentos culturais de Fortaleza e outros municípios, elaborando passeios virtuais para cada um.
Sob coordenação de Esequiel Mesquita, a equipe do projeto é formada pelos estudantes de pós-graduação Joana Guedes e Renan Paulo Nogueira, com apoio dos guias Nataly Pereira da Silva e Francisco Welio Gomes Evangelista, e dos técnicos do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) Diego Rodrigues e Vinícius Leitão Lima. Além do ICMBio e da Cooperativa dos Guias do Parque de Ubajara, o projeto tem apoio da Secretaria do Turismo do Ceará (Setur).
Todos os passeios estão disponíveis na plataforma. Clique aqui!
Ubajara (CE) tem floresta em meio à caatinga e esportes ao ar livre
Fonte:G1/CE
